sábado, 19 de setembro de 2009

todas as almas

"Todas as almas" está para "Seu rosto amanhã" assim como o "The hobbit" está para "O senhor dos anéis". Talvez eu devesse dizer apenas que "Todas as almas" funciona como um prólogo ao último livro de Javier Marías, mas o paralelo com os livros de J.R.R. Tolkien me parece mais adequado. Já havia lido o original (All souls) e inclusive já o resenhei aqui, em um distante dezembro de 2007. Acontece que após a leitura do último volume de "Tu rostro mañana" me pareceu importante checar algumas passagens, tentar entender melhor a genealogia dos muitos personagens que são retomados, verificar se eles, os personagens, se desenvolveram bem ou são apenas repetidos artificialmente. Jaime Deza não tem este nome ainda (ele nunca é nominado na verdade). Toby Rylands mostra toda sua sagacidade e experiência no final do prólogo, mas será seu irmão Peter Wheeler quem fará as vezes de confidente e interlocutor do narrador Deza posteriormente. Enfim, trata-se sim do caso de um bom livro, com bons personagens que acabam merecendo um reaproveitamento, que não desapareceram sem rastro da cabeça de seu criador. "Todas as almas" foi publicado em 1989, no ano mesmo da queda do muro, e o primeiro volume de "Seu rosto amanhã" foi publicado em 2002. Este é exatamente o período que os personagens de Javier Marías neste último livro, principalmente Beltran Tupra, reputam como sendo aquele no qual os serviços secretos do mundo, não tendo mais o que fazer, passaram a trabalhar para interesses privados, grandes corporações, magnatas, ditadores, políticos inescrupulosos e enfim, até para alguns terroristas. Claro, nada disto é discutido em "Todas as almas". Aqui a ambientação é a vetusta universidade Oxford, onde se ensina, se adestra e se julga há 900 anos. O narrador está mais interessado em resolver seu romance clandestino com sua colega Clare Bayes, em acompanhar os planos para a velhice de seu amigo homossexual Cromer-Blake, em entender melhor quem é o curioso poeta Gawsworth, em decidir o que fazer de sua vida, congelada em uma Oxford que nunca será sua de fato (saberemos depois que ele voltará a Espanha, se casará, terá dois filhos, se separará e voltará a viver em Londres, como tradutor na BBC). Se não é o melhor dos Marías que já li ao menos vale como introdução a seu universo, uma introdução a seus truques literários. [início 05/09/2009 - fim 09/09/2009]
"Todas as almas", Javier Marías, tradução de Monica Stahel, editora Martins Fontes (1a. edição) 1999, brochura 14x21, 232 págs., ISBN: 85-336-0990-6

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