sexta-feira, 20 de abril de 2007

mountolive

Eu já avisei antes, mas é bom repetir novamente: não leia esta resenha se você ainda não leu Justine e Balthazar , ou melhor, faça o que lhe aprouver, mas cuidado. Terminei ontem Mountolive, o terceiro volume da tetralogia "O Quarteto de Alexandria". Mais uma camada do pergaminho foi desvelada e sabemos um tanto mais sobre alguns aspectos obscuros nos outros dois volumes. Ficamos sabendo finalmente o nome do narrador dos dois primeiros e nos conformamos afinal com o fato dele ser bem menos senhor do suas vontades do que parecia no primeiro volume. O formato mudou um tanto neste volume. Um personagem menor dos anteriores é agora o protagonista e aquele quem experimenta a maior parte dos fatos descritos. Os capítulos são como anteriormente bem variados. Há cartas, memórias, simples descrições. Já previnido pela transição abrupta de Balthazar em relação a Justine fiquei esperando reviravoltas em Mountolive, mas confesso que há algo que me deixou menos entusiasmado neste volume. As surpresas são muitas (por isto mesmo ainda vale a lembrança de que o risco da leitura desta resenha é todo teu), mas é como se o tom delas revelassem ser mesmo uma construção humana o livro e por isto mesmo vemos a maquinaria da construção de um romance, de uma ficção e não o retrato de um aspecto do mundo real. É difícil não lembrar do "Em busca do tempo perdido" ao terminarmos este volume. Como nesta seqüência de livros do Durrell, Proust também apronta uma série de metamorfoses em seus personagens e vai nos surpreendendo sutilmente ao revelá-las. Acho que a maquinaria literária do Proust mais verossímel e adequada, mas ainda não enfrentei o último volume do Durrell para ser assim tão duro com ele. O velho Proust povoa minha memória com camadas e camadas de aspectos da psique humana e eu não me canso de tentar entender as nuances das escolhas morais de seus personagens. Um tanto menos cromático Durrell nos apresenta Mountolive quase como uma história de detetives e de intrigas diplomáticas. Ficamos sabendo como funcionava um tanto a burocracia no oriente médio no período entre grandes guerras. Assim como Mountolive terminamos o livro cansados daquele exotismo mediterrâneo e oriental. As muitas vozes do livro competem entre si e agora percebemos que há infinitos muitos possíveis e o autor, por força da sua arte, pode construir o que bem lhe aprouver. Cada um de nós, por mania, cupidez, moralismo ou despreendimento escreveria um desenlaçe distinto. Antes de passar a Clea vou ficar um tempo pensando em como eu terminaria este livro, em como eu resolveria as questões que se apresentaram até aqui. Será que minha versão imaginada encontrará semelhanças com a versão real? Veremos.
"Mountolive - O Quarteto de Alexandria", Lawrence Durrell, tradução de Daniel Pellizzari, editora Ediouro, 1a. edição (2006) ISBN: 85-00-01758-0

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